terça-feira, 24 de setembro de 2024

A falta ao trabalho para acompanhar o filho ao médico


 Autora: Lucy Toledo das Dores Niess(*)

O art.473, inciso XI, da CLT, introduzido pela Lei nº 13.257/2016, autoriza o trabalhador contratado sob o regime da CLT a se ausentar do dseu trabalho, um dia pot ano, para acompanhar o filho de até 6 (seis) anos de idade ao médico em consulta e procedimentos, sem prejuízo do salário.

Não menciona a lei se esse acompanhamento é permitido só para o pai ou para a mãe biológicos, sendo, entretanto, entendimento dos tribunais, a extensão desse direito aos pais socioafetivos e tutores legais.

Muito embora, no estado atual da matéria, a falta justificada seja de só UM dia por ano, poderá haver majoração nos dias de ausência se houver acordo individual entre o empregado e o empregador nesse sentido, ou, ainda, por existência de cláusula na convenção coletiva das diferentes categorias profissionais oferecendo condição mais benéfica ao trabalhador.

A jurisprudência tem considerado, em alguns casos, que a falta justificada, por poucos dias, para acompanhar o filho em tratamento de saúde, deve ser aceita, não se podendo, entretanto, caso haja processo judicial, garantir o desfecho favorável em um processo trabalhista.

Destarte, inexistindo acordo individual ou norma na convenção coletiva, o trabalhador poderá se socorrer do Poder Judiciário.

Há decisões que condenam o empregador pela demissão, por juta causa, do empregado que tenha faltado mais de um dia, com a apresentação do atestado médico, sob o fundamento da aplicação dos princípios da boa-fé, da dignidade humana e do valor social do trabalho.

Na mesma direção, o entendimento do TRT de São Paulo, no qual se destaca o seguinte trecho:

“Irretocável a fundamentação do juízo de origem, que se adota como razão de decidir, no seguinte sentido:

 

"Ainda que não haja na CLT norma expressa que considere como faltas justificadas a ausência de uma mãe que acompanha o seu filho menor (com apenas um ano, no presente caso!) em uma internação hospitalar, é sabido que o artigo 227 da CF/88 estabelece que "é dever da família, da sociedade e do Estado, com absoluta prioridade, assegurar à criança o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão."

Não acompanhar o seu filho no hospital poderia constituir, inclusive, abandono de incapaz, na forma do art. 133 do Código Penal.
O art. 4°, parágrafo único, "a", da Lei n° 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) vaticina a garantia de prioridade à criança e ao adolescente, nesta compreendida a primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias. O caput do referido artigo deixa claro que o dever é voltado à família, à comunidade, ao Poder Público e à sociedade em geral, nesta compreendida o empregador, certamente, pois não está fora da "sociedade". Em compasso com tal artigo, o art. 70 do ECA reza que é dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação aos direitos da criança e do adolescente.
Resta claro, como bem defende a autora, que não estão açambarcadas no art. 473, XI, da CLT todas as hipóteses de acompanhamento dos filhos por seus pais. Até mesmo em interpretação puramente literal é evidente que o dispositivo se refere à consulta médica, o que se pode compreender como um procedimento eletivo. No caso dos autos, a hipótese é de internação do filho da autora, que durou de 02.07.2023 a 14.07.2023.
Fazendo analogia com a doutrina de direito penal, é inquestionável que nenhuma culpa tem uma mãe de acompanhar seu filho em internação médica e faltar ao trabalho, pois seria caso de inexigibilidade de conduta diversa.
Se compreende o disposto no art. 12 do ECA, ao tratar do acompanhamento das crianças por um de seus genitores nos estabelecimentos de saúde não apenas como um direito, mas também como um dever dos pais.

As faltas da reclamante se justificam por que ela estava cumprindo um dever constitucional, que fora ignorado pela reclamada. Negar à reclamante o direito de acompanhar o seu filho e permitir o desconto dos dias não trabalhados e ainda considerar tal situação como desídia é ignorar os princípios da proteção integral do menor (art. 227 da CRFB), da função social da empresa (art. 5°, XXIII, da CRFB) e da dignidade da pessoa humana (art. 1°, III, da CRFB).
Necessário ainda destacar que a desídia apenas se configura quando estamos diante de situações reiteradas que demonstram desleixo com o serviço prestado que, ao serem punidas, não são capazes de mudar gradativamente postura do empregado, culminando em sua dispensa por justa causa. Ou seja, além das faltas da reclamante não serem injustificadas, o que por si só já afastaria qualquer mínima punição, não houve qualquer gradação, sendo a reclamante sumariamente dispensada por justa causa.
(...)

Não há ainda falar em abandono de emprego, por não estar presente o requisito objetivo para a sua caracterização, qual seja, a faltas injustificadas por mais de 30 dias e nem o requisito subjetivo, qual seja, a vontade deliberada de abandonar o emprego, tendo em vista que comprovado à reclamada que a reclamante se ausentou em razão de cuidados com a saúde do seu filho. (...)". (g.n.). (TRT 2ª R.; RORSum 1000924-56.2023.5.02.0341; 17ª Turma; Rel. Des. Homero Batista Mateus da Silva; Julg. 09/02/2024).
No mesmo sentido a ementa do Recurso Ordinário nº 0097400-72.2013.5.13.0001, do TRT da 13ª Região:
AFASTAMENTO PARA ACOMPANHAMENTO DE FILHO MENOR SUBMETIDO À CIRURGIA. FALTAS AO TRABALHO ABONÁVEIS. DESCONTO SALARIAL.DEVOLUÇÃO."Embora não haja regramento legal prevendo como ausência justificada aquela decorrente de acompanhamento do pós-operatório de filho menor, é absolutamente censurável impor à trabalhadora, principalmente na qualidade de mãe, ter de optar entre cuidar do filho enfermo ou exercer suas atividades laborativas para receber a remuneração correspondente. Com efeito, a partir da previsão do art. 227 da CF e dos arts. 4º, 5º d 7º do ECA, que expõe de forma clara os encargos referentes aos cuidados destinados às crianças, a necessidade de afastamento da obreira de seu labor tornou-se essencial, ou melhor, obrigatório, sob pena de violação dos mencionados normativos. Deve-se, portanto, ser assegurado à obreira o direito ao salário dos dias em que teve de se ausentar para acompanhar filho menor submetido a procedimento cirúrgico. Recurso obreiro parcialmente provido, no particular." (TRT 13ª R.; RO 0097400-72.2013.5.13.0001; Segunda Turma; Rel. Des. Wolney de Macedo Cordeiro; Julg. 11/11/2014; DEJTPB 14/11/2014).

 O fato de estar a criança doente em casa não é justificativa para a falta do empregado, não podendo ser estendido o sentido legal nesse caso.

Não há, também, exceção na legislação quanto à hipótese de pais com filhos com doenças crônicas ou doenças que requeiram hospitalização, muito embora haja decisão judicial no sentido de que se, por poucos dias, a falta do empregado para acompanhar filho deve ser aceita.

Nesse sentido, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 1.369/2007, que justifica a falta do trabalhador até três dias úteis em caso de doença do filho que estiver precisando de assistência direta e constante, comprovada por laudo médico. Permite, ainda, a ausência pelo tempo que for prescrito pelo médico, quando o filho estiver acometido de doença infectocontagiosa, como pneumonia e meningite.

E, mais recentemente, sob o fundamento de que cuidar de um filho doente é um direito fundamental dos pais, alinhado com os princípios dos direitos humanos, que incluem o direito à saúde e ao bem estar familiar, também tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 2.672/2014, apensado ao citado Projeto de 2007, que altera a CLT para dispor sobre o afastamento do empregado do trabalho para acompanhamento de filho de até anos de idade, por motivo de doença, pelo tempo que se fizer necessário, até o máximo de 30 (trinta) dias, consecutivos ou não, a cada período de 12 (doze) meses.

Ressalte-se que, se o empregado precisar se ausentar do trabalho por motivo de saúde do filho, deve comunicar o seu empregador o mais breve possível, tanto via telefone quanto via e-mail.

Para o acolhimento da justificativa da falta, necessária a comprovação da doença do filho sendo suficiente, para tanto, o atestado médico em nome do filho, devendo o mesmo ser entregue ao empregador sem a necessidade de se apresentar atestado de acompanhante. Como o atestado médico tem valor legal, o empregador é obrigado a aceitá-lo, abonando a falta. 

Esta é a finalidade e a sua não apresentação não traz outra consequência ao empregado, mas tão só desobriga o empregador de abonar a falta.

O atestado médico só poderá ser recusado se houver inconsistências nas informações, ausência do motivo que o gerou, rasuras na data ou no dia da lavratura, indícios de falsificação do carimbo ou da assinatura do médico. Importante observar que a prática de atestado falso é crime, podendo implicar em demissão por justa causa.

Não pode haver qualquer punição ao empregado quando exerce apenas o direito de solicitar o que lhe é garantido por lei. O empregador, se não acolher o pedido, é que poderá ser punido, restando ao empregado comunicar o fato ao Sindicato de sua categoria, ao Ministério do Trabalho ou ao Ministério Público do Trabalho. Persistindo a recusa do empregador, o empregado poderá requerer judicialmente o pagamento do salário referente à(s) falta(s) justificada(s).





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