sábado, 2 de agosto de 2025

Reflexões sobre a atividade de pesquisa nos cursos de graduação em Administração


 @ Octavio Ribeiro de Mendonça Neto 

 A Constituição Brasileira estabelece no seu artigo 2027 que: "As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão." Nesse sentido, no espírito do legislador, as Universidades devem manter atividades didáticas voltadas para o aprendizado dos alunos, ministrando aulas (ENSINO); desenvolver, aplicando o método científico, atividades de pesquisa materializadas principalmente, mas não exclusivamente, no Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) e nos projetos de Iniciação Científica.(PESQUISA) e; de acordo com o artigo 43 da Lei 9394 de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) " Promover a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição." (EXTENSÃO)[


No presente texto, vamos nos ater às atividades de Pesquisa, nos Cursos de Graduação da área de Administração, sem esquecer contudo indissociabilidade entre os três eixos (Ensino, Pesquisa e Extensão). Nos Cursos de Graduação em questão, a atividade de Pesquisa se materializa basicamente na disciplina de Metodologia Científica e no Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) e, em menor escala, em termos de volume, nos Projetos de Iniciação Científica.

No meu entender, baseado na minha prática de educador e pesquisador de longa data, o processo de elaboração do TCC constituiu, uma das etapas mais importantes, talvez, ouso afirmar, a mais importante na formação do docente da área de gestão.

Por que de uma afirmação tão peremptória?

Senão vejamos: O Parecer do Conselho Nacional de Educação / Câmara de Educação Superior de 2002 (CES/CNE 0146/2002) que trata Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de graduação nas áreas em questão estabelece, dentre as competências e habilidades desejadas do formando: "reconhecer e definir problemas, equacionar soluções, pensar estrategicamente, introduzir modificações no processo produtivo, atuar preventivamente, transferir e generalizar conhecimentos e exercer, em diferentes graus de complexidade, o processo da tomada de decisão."

A melhor forma de desenvolver a competências e habilidades supracitadas, , é, sem sombra de dúvidas, o processo de elaboração do TCC. É através desse processo que o docente irá exercer a interdisciplinaridade e aplicar, na prática e de forma aprofundada, o método científico, apreendido principalmente na disciplina de Metodologia Científica. O Método Científico se resume na aplicação da lógica na ciência e se constitui de um conjunto de regras e procedimentos básicos e na observação sistemática e controlada de experiências ou pesquisa de campo que o docente – para maiores detalhes ver Popper (2005) – É através da aplicação desse método, que o docente irá aprender a identificar problemas e equacionar soluções fundamentadas.

Esse conhecimento é importante, indispensável eu diria, para um bom desempenho da prática profissional. Sem ele , o profissional fica limitado a se referir a sua experiência com problemas semelhantes que vivenciou no passado, o que é sem dúvida importante, mas de pouca utilidade quando se defrontar com problemas novos, de natureza complexa, o que é cada vez mais uma constante no mundo contemporâneo dos negócios. Pior ainda, e com resultados mais desastrosos é quando se recorre ao achismo, ao senso comum ou ao comportamento de rebanho (tendência para fazer o mesmo que os outros fazem, sem uma avaliação crítica). O comportamento de algumas empresas durante a epidemia do COVID 19 é um bom exemplo, já que esse foi um problema complexo, sem referências anteriores (a referência mais próxima foi a epidemia da gripe espanhola em 1910, que ocorreu em um contexto totalmente diferente do atual).

Mas se tudo isso é sobejamente conhecido, por que refletir sobre isso?

Ocorre que o mesmo Parecer do Conselho Nacional de Educação / Câmara de Educação Superior de 2002 que estabelece as competências e habilidades desejadas do formando de Administração, estabelece também que "[...] a Monografia (TCC) se insere no eixo dos conteúdos curriculares opcionais, cuja adequação aos currículos e aos cursos ficará à cargo de cada instituição que assim optar [...]" além de observar que "[...] a monografia (TCC), pelas suas peculiaridades, deve ter, em cada instituição que por ela opte expressamente, regulamentação própria, com critérios, procedimentos e mecanismos de avaliação bastante explícitos, bem como diretrizes técnicas relacionadas com a sua elaboração." Em resumo, as Instituições de Ensino Superior (IES) têm a opção de exigir ou não a elaboração do TCC e, no caso de optarem, tem a liberdade de terminar como ele deve ser elaborado e avaliado. Aqui cabe uma observação: A opção é da IES e não do aluno, como alguns maldosamente querem fazer crer.

Isto posto, o problema sobre o qual propomos uma reflexão reside justamente no caráter opcional do TCC. Esse caráter opcional do TCC tem levado muitas IES, a não incluir o TCC nas suas grades curriculares. Isso normalmente se observa naquelas IES que encaram a atividade de ensino como um negócio cujo foco é o lucro , e tratam seus alunos como clientes, cuja satisfação deve ser atendida a qualquer custo, satisfação essa que não tem nada a ver com a qualidade do ensino e com o desenvolvimento de uma visão crítica, mas sim com a facilidade na obtenção do diploma.

Diante desse contexto, para essas IES, a não exigência do TCC é uma forma condizente com seus reais valores pois não só possibilita uma redução de custos contribuindo dessa forma para a maximização dos lucros, mas também se alinha com a satisfação de seus "clientes", facilitando a obtenção do diploma.

Isso não se aplica aquelas IES, e temos vários exemplos delas no setor privado, confessionais ou não, cuja primeira preocupação é a educação, com foco na formação de um aluno que tenha capacidade de exercer a sua cidadania de forma plena e sua profissão de forma ética e eficiente. Evidentemente essas IES, têm que garantir sua sustentabilidade financeira, mas isso não implica na obtenção de lucros extraordinários para serem distribuídos a seus acionistas.

Sempre fui favorável e me empenhei pela democratização do ensino, mas isso não pode ser feito a qualquer custo, muito menos facilitando e promovendo a industrialização do ensino. Educação não é um negócio, educação é um processo de desenvolvimento humano.

Referências Bibliográficas

BRASIL.Constituição (1988). Art. 227. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República,. 

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, v. 134, n. 248, 23 dez. 1996. Seção 1, p. 27834- 27841. Disponível:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso em 03/07/2025;

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Câmara de Educação Superior. Parecer CNE/CES nº 146/2002, de 03 de abril de 2002. Disponível em https://www.gov.br/mec/pt-br/cne/normas-classificadas-por-assunto/diretrizes-curriculares-cursos-de-graduacao. Acesso em 07/07/2025;

Popper, K. (2005). A Lógica da Pesquisa Científica. 2 ed. Cultrix, São Paulo.

OCTAVIO RIBEIRO DE MENDONÇA NETO














-Graduado em Engenharia Mecânica pelo Instituto Mauá de Tecnologia (1972);

-Especialista em Economia de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas – FGV/ SP – CEAG (1977);

-Mestre em Ciências Contábeis e Atuariais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2002) e

Doutor em Contabilidade e Atuária na FEA / USP (2007).

Atualmente é Professor Adjunto I da Universidade Presbiteriana Mackenzie nos cursos nos cursos de Mestrado e Doutorado Profissional do Programa de Pós-Graduação em Contabilidade,Finanças e Tecnologias de Gestão .

Nota do Editor:

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