quarta-feira, 28 de maio de 2025

A Cirurgia Robótica e a Negativa de Cobertura pelos Planos de Saúde

Autor: Magnus Rodrigo Cardoso Rossi(*)



Introdução

A medicina contemporânea tem evoluído de forma exponencial, e um dos marcos mais significativos desse avanço é a introdução da cirurgia robótica. Este procedimento caracteriza-se pelo uso de sistemas computadorizados que conferem ao cirurgião maior precisão, estabilidade e controle, com benefícios concretos ao paciente, como redução do risco de complicações, menor tempo de internação e recuperação mais rápida.

Apesar disso, é crescente o número de casos em que operadoras de planos de saúde recusam a cobertura desse tipo de cirurgia, mesmo quando há prescrição médica formal e estrutura hospitalar disponível para sua realização.

Esta recusa, fundamentada, na maioria das vezes, na alegação de ausência de previsão específica para a modalidade robótica no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS, suscita importantes discussões jurídicas que merecem ser aprofundadas, sobretudo no que tange à proteção do direito à saúde e à dignidade da pessoa humana.

Dos argumentos das negativas

As operadoras costumam justificar a negativa na inexistência de previsão expressa da cirurgia robótica no Rol da ANS ou na ideia de que se trata de um método ainda considerado experimental ou de custo elevado, não amparado contratualmente.

Contudo, tal posicionamento não se sustenta juridicamente. É imprescindível compreender que, em grande parte dos casos, o ato cirúrgico principal — como uma prostatectomia, histerectomia ou miomectomia — está, sim, previsto no rol, sendo a discussão apenas quanto à técnica empregada.

Ora, cabe exclusivamente ao médico assistente, com respaldo técnico-científico, decidir qual a melhor via de abordagem cirúrgica, não sendo lícito à operadora impor ao paciente a utilização de técnicas menos eficazes ou mais arriscadas, sob a justificativa de que a via robótica não está expressamente prevista.

A técnica não pode se sobrepor à vida

A recusa à cobertura, sob o argumento de que o procedimento é realizado por via robótica, configura abusividade, violando a boa-fé contratual e colocando o consumidor em desvantagem excessiva (art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor).

A negativa afronta, ainda, o direito fundamental à saúde, previsto nos artigos 6º e 196 da Constituição Federal, bem como o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF).

Assim, o que deve ser avaliado não é se o equipamento utilizado possui previsão no rol da ANS, mas sim se o ato cirúrgico está contemplado e se existe indicação médica fundamentada que justifique a adoção da técnica mais moderna e segura para aquele paciente.

O Papel do advogado na demanda

Em casos como esse, a atuação do advogado especializado em Direito à Saúde é imprescindível. É este profissional que fará a adequada análise documental, incluindo a prescrição médica, a negativa formal do plano e demais elementos clínicos, e escolherá a estratégia processual mais eficaz para tutelar o direito do paciente.

O ajuizamento de ação com pedido de tutela provisória de urgência é, via de regra, a medida cabível, com vistas à obtenção de ordem judicial que determine à operadora o imediato custeio da cirurgia, evitando-se danos irreparáveis ou de difícil reparação à saúde do beneficiário.

Da escolha estratégica

A definição da via judicial adequada exige análise técnica apurada. Embora os Juizados Especiais Cíveis ofereçam procedimentos mais rápidos e desburocratizados, nem sempre são a escolha mais apropriada, especialmente quando envolvida uma questão de alta complexidade médica, como ocorre com a cirurgia robótica.

Nesses casos, recomenda-se ponderar:

  • O valor da causa, respeitando os limites legais para tramitação no Juizado;
  •  A necessidade de produção de prova pericial;
  •  A urgência da medida; e
  • A previsibilidade de recursos e eventual resistência da operadora.
O advogado deve buscar o caminho mais técnico e eficiente, ciente de que, embora possa ter um "plano B" em caso de indeferimento em pedido de liminar urgência, sua atuação deve ser precisa e estratégica, pois muitas vezes o que está em jogo é a própria vida do cliente.

Considerações finais

A negativa de cobertura para a cirurgia robótica, quando injustificada e em desacordo com a prescrição médica, não pode ser tolerada. O Poder Judiciário, sensível a essa realidade, tem assegurado aos pacientes o direito à realização do procedimento, com fundamento na proteção à vida, à saúde e à dignidade da pessoa humana.

Advogados, acadêmicos e beneficiários devem estar atentos a essa realidade, compreendendo que a informação qualificada e a atuação jurídica especializada são instrumentos indispensáveis para garantir direitos e proteger vidas.

A medicina avança, mas é preciso que o Direito avance junto, assegurando que nenhum paciente seja privado de um tratamento potencialmente salvador por decisões pautadas apenas em interesses econômicos.

Assim, mais do que uma questão contratual, trata-se de uma questão de humanidade.

*MAGNUS ROSSI CARDOSO ROSSI
























- Advogado inscrito na OAB/RJ há 25 anos;
- Formado em Direito pela Universidade do Grande Rio - RJ (2000);
- Pós-graduado em Direito do Consumidor e Responsabilidade Civil pela Universidade Cândido Mendes - RJ (2021) ;
- Pós-graduado em Direito Médico e da Saúde pela Faculdade Legale - SP (2022) e
 Pós-graduado em Direitos Humanos pela Faculdade Legale SP (2024)

Nota do Editor:

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