quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

Mediação familiar na prática


 Autora: Àguida Arruda Barbosa (*)

"Amor é bondade. Ou melhor, é manifestação da bondade. E a bondade é a mais alta qualidade do ser humano. É sua virtude suprema. Mais importante do que o raciocínio, mais necessária do que a ciência. Nada existe no homem de mais precioso, de mais fecundo e construtivo, do que sua bondade e seu amor." Goffredo Telles Jr.
Mediação é um ato de amor e bondade. Esta assertiva extraída das inesquecíveis lições do Professor Goffredo revelam a essência da natureza humana, manifestada pelo altruísmo, afastando o egoísmo.

A partir desta premissa, ser mediador é se despir do orgulho, do apego e das verdades absolutas para abrir um tempo-espaço capaz de acolher o sofrimento e a angústia dos mediandos, que se encontram, momentaneamente, afastados pelo conflito.

A formação do mediador tem como objetivo compreender que conflito faz parte da convivência humana, portanto, deve ser reconhecido como algo positivo. Daí ser incorreto afirmar que mediação visa à solução ou resolução de conflito, já que seu escopo é a transformação do conflito em oportunidade de desenvolvimento da personalidade.

A mediação corresponde a um marco civilizatório decorrente dos novos paradigmas que regem as relações interpessoais, a partir do princípio constitucional da proteção da dignidade da pessoa humana, visando à compreensão da comunicação em tempos de grandes mudanças axiomáticas.

A partir deste marco teórico, vem a indagação: como se dá a prática da mediação familiar?

O conhecimento da interdisciplinaridade é relevante para que se possa aplicar a teoria à prática da mediação, a partir do desenvolvimento de diferentes óticas sobre o mesmo tema.

A primeira qualidade a ser desenvolvida pelo mediador é a assertividade, o que dará segurança aos mediandos. Na primeira sessão de mediação os protagonistas deverão ser informados acerca do desenvolvimento do trabalho e duração de cada sessão (50 minutos).

Há correntes de mediação que não limitam o número de sessões, porém, a mediação que visa à transformação do conflito não deve ultrapassar cinco sessões, evitando que o trabalho se transforme em uma espécie inadequada de terapia de casal, afastando-se da demanda inicial, qual seja, aprender uma nova forma de se comunicar.

A remuneração do trabalho deve ser convencionada na primeira sessão, esclarecendo a importância de realizar o pagamento ao final de cada sessão, equivalendo ao reconhecimento daquele conteúdo trabalhado. O agendamento da sessão seguinte representa o compromisso com a continuidade. Isso cria um vínculo de confiança entre os partícipes e permite que se sintam livres para decidir quando parar.

A segunda etapa da prática da mediação é promover a escuta dos mediandos, que pressupõe uma atitude consciente do mediador – escuta ativa - pois depende de uma decisão que envolve, em uníssono, pensamento, sentimento e ação.

A escuta não decorre de um conhecimento intelectual, embora pressuponha fundamentação teórica capaz de dar parâmetros a esta entrega a uma experiência afetiva. A escuta ativa é a essência da mediação, tratando-se de uma atitude de acolhimento na qual o mediador entrega-se aos mediandos, estabelecendo um vínculo de reciprocidade, orientado pela confiança e pela empatia.

A importância da escuta é que cada mediando se escuta, como um espelhamento e, não raro, eles se surpreendem com a sua própria performance e atuam para mudar a verbalização (pensamento – sentimento – ação).

Cada partícipe da mediação fala de seu sentimento em relação ao conflito, sem reservas, porque há um pacto subjacente de exclusão de qualquer julgamento. Não há certo e errado. Não se atribui razão a um em detrimento do outro.

No entanto, há escolas que confundem mediação com conciliação, por falta de fundamentação teórica. Consideram que o sucesso da mediação é a celebração do acordo (solução e resolução do conflito!)

Uma questão que surge, com frequência, é acerca da participação dos advogados dos mediandos nas sessões de mediação.

Em decorrência da essência da mediação - um ato de amor e bondade - as sessões devem ter a presença exclusiva dos mediandos e do mediador.

Para que os causídicos não se sintam excluídos, pois, muitas vezes, são eles que encaminham os clientes para a mediação, há mediadores que promovem uma sessão de pré-mediação com os advogados, esclarecendo que as questões jurídicas serão levadas a eles, tendo seus respectivos papéis preservados, inclusive na redação de eventual acordo que possa resultar da transformação do conflito.

Outra característica que merece destaque é que ao mediador é conveniente não conhecer a narrativa dos sujeitos do conflito, seja por intermédio dos próprios mediandos, seja por meio dos advogados. O que importa na mediação é a forma da comunicação, como expressam esta fórmula: pensamento - sentimento – vontade. Isso vai aparecer dos atos falhos, na repetição do relato, no silêncio, na expressão corporal, enfim, trata-se de uma linguagem muito peculiar a cada um.

Ao final da cada sessão, solitariamente, o mediador deverá avaliar o seu papel, indagando, consigo próprio: estou mediando, aconselhando ou conciliando? Ou outra coisa?

Cada mediação é única, é singular. Afinal, é um ato de amor e bondade.

* ÁGUIDA ARRUDA BARBOSA














-Advogada especializada em Direito de Família;
- Graduada em FADUSP (1972);
- Mestrado pela FADUSP (2003);
- Doutorado pela FADUSP(2007);
-Mediadora familiar interdisciplinar
-Professora de Direito Civil e Mediação Familiar Interdisciplinar; e
-Pesquisadora do tema Mediação na França desde 1.989, com participação em congressos, cursos e simpósios na França, Canadá e Portugal.
-Mediadora familiar interdisciplinar;

Nota do Editor:

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