quarta-feira, 29 de março de 2017

O impacto da MP 764/2016 na relação de consumo


A medida provisória sancionada pelo presidente da república no dia 26 de Dezembro de 2016 dispõe sobre a diferenciação de preços de bens e serviços oferecidos ao público, em função do prazo ou do instrumento de pagamento utilizado. 

Nesta medida está inclusa ao seguinte norma legal:
"Art. 1º - Fica autorizada a diferenciação de preços de bens e serviços oferecidos ao público, em função do prazo ou do instrumento de pagamento utilizado.
Parágrafo único. É nula a cláusula contratual, estabelecida no âmbito de arranjos de pagamento ou de outros acordos para prestação de serviço de pagamento, que proíba ou restrinja a diferenciação de preços facultada no caput.
 Art. 2º - Esta Medida Provisória entra em vigor na data da sua publicação."
Tal medida provisória modificou diversas jurisprudenciais, fato esse trazido através da analise de Recurso Especial Nº 1.479.039/MG julgado na 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, onde o relato do processo, o Ministro Humberto Martins em seu voto, utilizando como parâmetro a aplicação da Lei 12.529/2011 (que trata do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência), considerou uma infração à ordem econômica, a discriminação de clientes com a imposição diferenciada de preços. Neste acórdão, o relator Martins aduziu:

"A compra com cartão de crédito também é considerada modalidade de pagamento à vista, pois o comerciante tem a garantia do pagamento assim que autorizada a transação".
Destacando ainda, a norma expressa contida no Código de Defesa do Consumidor, no seu artigo 39, Incisos V e X que diz:
"Art. 39: É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: 
(...) 
V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;
(...) 
X - elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços."
A MP faz parte do pacote de medidas anunciadas pelo presidente Michel Temer para aumentar a produtividade do país, para permitir que os comerciantes cobrem um preço diferente caso o serviço seja pago à vista ou no cartão de crédito ou débito.

Ocorre que na prática, é que ao invés de permitir o aquecimento do comercio e aumento da produtividade econômica, esta MP vem prejudicando muitos consumidores que não possuem condições de pagar por produtos e serviços a vista ou (dinheiro), e falsamente acreditaram que teriam condição de barganhar com as grandes empresas, visando obter um desconto.

Na verdade o que se pode observar é que ao invés de aquecer o mercado com produtos e serviços com um preço mais em conta, para o bolso dos consumidores, o que ocorreu foi uma grande discrepância entre o preço aplicado a vista e a prazo nas compras realizadas.

Tendo em vista que o preço repassado aos consumidores pelas pequenas, medidas e grandes empresas já estão incluso todos os riscos das atividades (pagamento de empregados, logísticas, custos com cartão de credito e empresarial). 

Agora alem do repasse deste risco da atividade, as empresas estão aplicando valores astronômicos para as compras realizadas na modalidade a prazo, demonstrando assim, um retrocesso na defesa do consumidor, e na proteção dos hipossuficientes.

Esta MP 764/16 não deve ser aplicada, devendo prevalecer as regras do CDC, dada a vulnerabilidade do consumidor, valendo destacar a jurisprudência dos tribunais, especialmente a do STJ, podendo-se citar os seguintes julgados:

"CONSUMIDOR E ADMINISTRATIVO. AUTUAÇÃO PELO PROCON. LOJISTAS. DESCONTO PARA PAGAMENTO EM DINHEIRO OU CHEQUE EM DETRIMENTO DO PAGAMENTO EM CARTÃO DE CRÉDITO. PRÁTICA ABUSIVA. CARTÃO DE CRÉDITO. MODALIDADE DE PAGAMENTO À VISTA. 'PRO SOLUTO'. DESCABIDA QUALQUER DIFERENCIAÇÃO. DIVERGÊNCIA INCOGNOSCÍVEL. 1. O recurso especial insurge-se contra acórdão estadual que negou provimento a pedido da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte no sentido de que o Procon/MG se abstenha de autuar ou aplicar qualquer penalidade aos lojistas pelo fato de não estenderem aos consumidores que pagam em cartão de crédito os descontos eventualmente oferecidos em operações comerciais de bens ou serviços pagos em dinheiro ou cheque. 2. Não há confusão entre as distintas relações jurídicas havidas entre (i) a instituição financeira (emissora) e o titular do cartão de crédito (consumidor); (ii) titular do cartão de crédito (consumidor) e o estabelecimento comercial credenciado (fornecedor); e (iii) a instituição financeira (emissora e, eventualmente, administradora do cartão de crédito) e o estabelecimento comercial credenciado (fornecedor). 3. O estabelecimento comercial credenciado tem a garantia do pagamento efetuado pelo consumidor por meio de cartão de credito, pois a administradora assume inteiramente a responsabilidade pelos riscos creditícios, incluindo possíveis fraudes. 4. O pagamento em cartão de crédito, uma vez autorizada a transação, libera o consumidor de qualquer obrigação perante o fornecedor, pois este dará ao consumidor total quitação. Assim, o pagamento por cartão de crédito é modalidade de pagamento à vista, pro soluto, implicando, automaticamente, extinção da obrigação do consumidor perante o fornecedor. 5. A diferenciação entre o pagamento em dinheiro, cheque ou cartão de crédito caracteriza prática abusiva no mercado de consumo, nociva ao equilíbrio contratual. Exegese do art. 39, V e X, do CDC: 'Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (...) V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; (...) X - elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços". 6. O art. 51 do CDC traz um rol meramente exemplificativo de cláusulas abusivas, num 'conceito aberto' que permite o enquadramento de outras abusividades que atentem contra o equilíbrio entre as partes no contrato de consumo, de modo a preservar a boa-fé e a proteção do consumidor. 7. A Lei n. 12.529/2011, que reformula o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, considera infração à ordem econômica, a despeito da existência de culpa ou de ocorrência de efeitos nocivos, a discriminação de adquirentes ou fornecedores de bens ou serviços mediante imposição diferenciada de preços, bem como a recusa à venda de bens ou à prestação de serviços em condições de pagamento corriqueiras na prática comercial (art. 36, X e XI). Recurso especial da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte conhecido e improvido" (STJ, REsp 1479039/MG, rel. ministro Humberto Martins, 2ª Turma, DJe 16/10/2015)." 
Apesar das varias formas de pagamento aumentam as vendas, mas o consumidor e parte mais fraca desta relação de consumo não podem assumir os riscos do empreendimento, esta Medida Provisória mostrou-se prematura, devendo assim os consumidores realizar uma pesquisa de mercado antes de adquirir qualquer produto ou serviço, devido a grande variação de preços praticados no mercado de consumo.

POR RAFAEL SOUZA RACHEL












-Advogado
-Pós-Graduando em Direito Civil e Processo Civil e


- Atuante na região metropolitana de Salvador, no Estado da Bahia

NOTA DO EDITOR :

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