domingo, 3 de abril de 2016

Porque não uso mais a nomenclatura "Machismo"

    


Aboli a nomenclatura 'machismo' do meu dicionário (e da minha boca que fala e dedos que escrevem) a partir do momento em que cheguei à conclusão de que todo o "conjunto-da-obra" que nos habituamos a chamar assim estava longe de ser "privilégio torto" de MACHOS, como a nomenclatura induz a crer.

Sabemos que linguagem é poderosa, certo?... 

E perigosa, na medida em que tende a perpetuar nosso olhar viciado. 
Pelo vício impresso no nosso olhar sobre o Mundo, inclusive pela linguagem que adotamos, nos habituamos a tornar pré-conceitos “paralelepípedos-do-pensamento”, automatizamos nossas reações a eles, deixando de ampliar nossas reflexões, num suposto “confortável saber aparente”, e vivendo numa limitada, ilusória e maléfica “ilha-zona-de-conforto-do-Espírito”. 
Aí é danado!... Há sequelas individuais, sociais, e elas atingem TODOS NÓS.

Isto é, comecei a ver o mesmo fenômeno assim designado (“machismo”?), ou – como prefiro dizer - a mesma estilística existencial assim designada, TAMBÉM no comportamento de bilhares de mulheres, assim como no comportamento de gente do grupo LGBTT*.

Por outro lado, cansei de ver muitos "machos" (???) adotarem (surpreendentemente?) uma linda (legítima, dura e boa) briga contra a própria preguiça de sumariamente obedecer à pressão de assim se comportar (de se comportar como “machistas”, o que boa parte da sociedade pode até desaprovar, mas acolhe, porque compreende por mero hábito), correndo heroicamente o risco de serem considerados desviantes. 

Aí, passei a considerar que a nomenclatura tinha se tornado no mínimo injusta, e - para o meu gosto - obsoleta. 

Diria mesmo perigosa, pela indução linguística que afirma que ela vem necessariamente de "machos", o que é mentira e encobre inúmeros fenômenos comportamentais e relacionais.
Para dar apenas um exemplo do que fica encoberto, se nos dedicarmos a pensar em homens, precisaremos pensar necessariamente em Masculinidades, o que envolve, no mínimo, homens heterossexuais, homens homossexuais, e transhomens.
Basta isso para colorir a nomenclatura vigente com hipercomplexidade...

A cada mês (pelo menos) descubro que há outros(as) autores(as) pensando no mesmo assunto que eu, e escrevendo sobre ele; não sou a única.

Ainda não me dei a ousadia de arrumar uma nova nomenclatura, e por isso me dou ao trabalhão de substituí-la, falando/escrevendo "CALDO CULTURAL PATRIARCALISTA/PATRIMONIALISTA" em seu lugar, todas as vezes em que observo essa obscena estilística existencial se manifestar (e como ela se manifesta ainda aos montes, bien sûr!...), seja em homens, Mulher, LGBTT*, ou Instituições.

É bom lembrar que os "machos" menos reflexivos e mais obedientes que ainda se submetem ao "conjunto da obra" em questão (se nos limitarmos a ver essa estilística neles), NÃO tratam como ‘'inferiores’' apenas a Mulher ou LGBTT*. 

Faz parte "do pacote" estilístico-comportamental tratar como inferiores também outros "machos"; aí essa nossa conversa se ampliaria horrores; só o meu modesto livro passaria de 284 páginas para umas 2.840 (rsrsrsrs), e eu não roubaria o seu tempo de vida com esse desdobramento de exemplos num único texto...

Uma das piores características do Caldo Cultural Patriarcalista Patrimonialista é o que costumamos resumir por "caretice", ambiente cultural que infelizmente tem assombrado nosso espaço vital, como um (surpreendente?) regresso ao retrógrado.

Nessa "caretice", o SILÊNCIO é aplaudido, em detrimento da FALA; a FALA é desqualificada, e quase vaiada. 
NO ENTANTO é a FALA que alivia, que gera pontes comunicativas e empáticas, que esclarece, que revela, que exercita a curiosidade, o diálogo e a diplomacia.

Nessa "caretice", a CIRCUNSPECÇÃO e a PERÍCIA são aplaudidas de pé, em detrimento da CRIATIVIDADE e do HUMOR, que são desqualificados e quase vaiados. 
NO ENTANTO são a CRIATIVIDADE e o HUMOR que geram toda a COMIDA DO ESPÍRITO HUMANO (todos os pontos da Cultura, e seu 'filé-mignon', a Arte). 

Talvez seja exatamente porque anda faltando essa "alimentação", que habitamos um Planeta que beira a esterilidade, inclusive a esterilidade Espiritual (o que não tem nada a ver com religiosidades), habitado por muitos ‘zumbis’ e ‘robôs’ neste momento em que o Humanismo parece mais uma vez ameaçado...

Talvez por isso muitos autores, como eu, têm estimulado uma urgente atenção maior às interioridades e à imaginação, pelo seu exercício reflexivo (leituras e psicoterapia, por exemplo) e ativo (convívio com a Arte, por exemplo). 
Sonhar é preciso. Viver, não é preciso.

OBS1.: 
Antes que pensem que quero que "mudem a palavra na marra", aviso que tenho horror a artificial e arrogantemente pretender "alterar" tanto palavras, quanto a História, como temos visto tanto por aí.
O que escrevi (revejam rapidamente) é que EU particular e singularmente, por motivos que minhas interioridades me gritam por dentro, NÃO USO MAIS essa nomenclatura; para mim, não serve para falar DAQUILO QUE DESEJO falar.
E - evidentemente - uso isso, como é do meu estilo, para PROVOCAR a reflexão, na esperança de compartilhá-las, balanceando-as com reflexões de possíveis leitores.
Provocar a reflexão especialmente para as MASCULINIDADES, cujas QUESTÕES aparentam NÃO DESPERTAR O MESMO INTERESSE, AS MESMAS VERBAS para pesquisas e trabalhos que as questões da Mulher e LGBTT*!
Além dos motivos simbólicos suficientemente fortes desenhados no inconsciente da maioria pela força do enganador Senso Comum, talvez não tragam ainda o mesmo número de votos...
O prejuízo é para toooooodos; por enquanto é o que sinto, é no que acredito...

OBS2.: 
Minha questão é trazer a tona o debate das Masculinidades, reivindicando para ele o mesmo empenho (e verbas, etc) que o da Mulher e LGBTT* recebem.
Se a Mulher e o LGBTT* e todo mundo desejam DE FATO que estes comportamentos sofram alteração, é imprescindível que o debate sobre as Masculinidades estejam em pé de igualdade de importância com os demais debates. POIS até agora NÃO ESTÃO... 
Permitir que o contingente masculino seja avaliado sistematicamente pelo ponto de vista do "erro" e/ou do "pathos" (o "machismo/macho que erra, o machismo/macho que é doente"), o que a nomenclatura da qual abdiquei só reforça, não leva coisa alguma muito adiante!... É avaliar negativamente, e o pior: parar por aí...
É como no tempo em que - por exemplo - tudo o que a Mulher fazia era fruto de "Histeria"... Essa nomenclatura eu também curiosamente não uso há anos...Rsrsrsrs...O quadro que ele identifica é (e sempre foi) identificado EM HOMENS E MULHERES. 
Freud desenvolveu seu Pensamento e sua Psicanálise se reportando sem medo ou pudor a si mesmo como "histérico", e sua pesquisa, num primeiro momento, abordava homens "histéricos" vindos da guerra; as clientes mulheres vieram depois!...
Só que HISTERIA, por sua vez, reporta a ÚTERO.
Daí essa associação por anos e anos do Pensamento e da Ação da mulher à "histeria", o que só reforçava a ideia de que Mulher é uma coisa "ruim e doente"; uma avaliação pelo negativo/negação.
Talvez por ser mulher, mas goste do Contingente Masculino, não desejo para eles o mesmo atraso.

Por CHRISTINA MONTENEGRO




-Psicóloga Clínica - Adolescentes/Adultos RJ
 - Palestrante – Aulas/Oficinas
e-mail : montenegro.cristina@gmail.com

- FORMAÇÃO ACADÊMICA

- Especialização em Sociologia Política e Cultura (PUC RJ) desde 2003
- Especializações em Psicologia Clínica conquistada por saber reconhecido
junto aos CFP e CRP desde 2002
- Especializações em Psicopedagogia conquistada por saber reconhecido
junto aos CFP e CRP desde 2002
- Supervisora em Psicologia Clínica, título conquistado por saber e
experiência prática reconhecidos junto aos CFP e CRP desde 1981
- Bacharelado em Artes Cênicas (Unirio) desde 1983
- Graduação em Psicologia (Faculdade Santa Úrsula)desde 1973
- Licenciatura em Psicologia (Faculdade Santa Ursula)desde 1972
- Informações detalhadas sobre cursos complementares feitos, participações em congressos e semelhantes, organização e administração de eventos, cursos administrados, palestras e aulas ministradas, entrevistas concedidas, atividades artísticas experimentadas, e demais atividades no site LATTES, (http://lattes.cnpq.br/9740919353194479)
- Autora do livro “HOMEM AINDA NÃO EXISTE – Compartilhando reflexões para que ele exista”, sobre Masculinidades (capa de LAERTE, prefácio da Dra.Marlise Matos, e ‘orelha’ de Fabio Porchat); encomendas ao site da Rede Livraria Cultura em todo o país: http://www.livrariacultura.com.br/p/homem-ainda-nao-existe-compartilhando-reflexoes-29104092
SITE: http://montenegrocristina.wix.com/chrismontenegropsic
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- SKYPE chrismontenegropsi (Atendimentos nele em casos de emergência).

7 comentários:

  1. Vc amiga tem o dom da palavra e a sabe usar bem. Gostei muito de sua reflexão. É sempre aprecio bastante suas inquietantes colocações. Todas são muito estimulantes, abertas, livres para todas as associações! Bacana! Muita Luz sempre!

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    1. Nossa! O elogio de uma colega do seu porte é uma grande responsabilidade, que agradeço, ruborizada! Beijos!

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