terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

O caos em Vitória – ES,uma breve crítica Hobbesiana


 Qualquer governo é melhor que a ausência de governo. O despotismo, por pior que seja, é preferível ao mal maior da Anarquia, da violência civil generalizada, e do medo permanente da morte violenta."   Thomas Hobbes

Se Hobbes estivesse vivo nesses últimos dias na cidade de Vitória do Espírito do Santo ou soubesse da absurda taxa de homicídios em nosso país, certamente ficaria satisfeito em saber que a máxima “o homem é o lobo do homem”, repetida em sua obra, O Leviatã, confirmaria a sua teoria jusnaturalista, tanto quanto ficaria triste em ver que o positivismo falhou na aplicação dos Direitos Naturais no Brasil. 

Temos falhado na transmissão de princípios básicos do Direito a Vida, escopo do anseio de preservação universal. Apesar de ser um país que se orgulha de ter uma Constituição cidadã, parece que a realidade torna explícito justamente o contrário. Falta a efetivação e o controle.

Thomas Hobbes presenciou desde o seu nascimento uma Inglaterra imersa em guerra civil, não muito diferente do que acontece hoje no Brasil de forma velada. Era a disputa de poder entre a velha nobreza britânica e uma ascendente burguesia mercantil, que posteriormente desbocou no desenvolvimento do capitalismo e na Revolução Industrial.

O filósofo social Hobbes funda sua teoria na defesa do maior bem que o homem possa ter; a vida. Para ele, os demais bens cumprem o papel de coadjuvantes na sua manutenção. 

A vida é um dos Direitos Naturais, aliás, o maior deles. Esses direitos permeiam nossas codificações, de forma a trazer, em tese, uma proteção ao indivíduo, possibilitando-lhe dispor de todos seus Direitos e Garantias, conforme expresso em lei. A fundamentação de determinados princípios do Direito Natural que são considerados bens humanos evidentes em si mesmos.

O que é esquecido pelo nosso academicismo é que embora nosso Direito seja juspositivado em nossa constituição 1988, ou seja, um direito fundamental detalhado em inúmeros artigos, positivado, ele é antes de tudo e em essência um Direito Natural do homem. Esquecemos que a Constituição Federal é calcada em princípios de Direito Natural, basta ver esses direitos positivados no Artigo 5º e seus incisos. Mas não é um direito que tem como base o místico, o religioso, até porque a nossa Constituição é laica. Temos a natureza humana como norte transcendente do Direito Natural.

Essa transcendência de justiça é bem demonstrada por Paulo Nader: 

"há uma outra ordem, superior àquela e que é a expressão do Direito justo. É a ideia de Direito perfeito e por isso deve servir de modelo para o legislador. É o Direito ideal , mas ideal não no sentido utópico, mas um ideal alcançável. A divergência maior na conceituação do Direito Natural está centralizada na origem e fundamentação desse Direito. Para o estoicismo helênico, localizava-se na natureza cósmica. No pensamento teológico medieval. O direito Natural seria a expressão da vontade divina. Para outros, se fundamenta apenas na razão. O pensamento predominantemente na atualidade é o de que o Direito Natural se fundamenta na natureza humana”.[1]
Embora nossa Constituição não possa ser entendida no todo como jusnatural, mas positiva, a aplicação dos Direitos Naturais se dá por via da aplicação de normas escritas e complexas. Ou seja, traduzimos o DN pela nossa linguagem técnica. 

Segundo o mestre italiano, Norberto Bobbio, o Direito Natural está mais para os Princípios assim como o Positivismo está para a aplicação desses Princípios. 

“O direito natural determina o conteúdo das normas jurídicas, enquanto o direito positivo, tornando-as obrigatórias, garante-lhes a eficácia; o direito natural constitui o fundamento de validade do ordenamento jurídico positivo, considerado em seu conjunto.”
Para Bobbio, o Direito Natural aos olhos de Hobbes é superior ao positivo, vez que a norma fundamental, que alicerça o Direito Positivo, lhe pertence. 

Aí mora o perigo, quando o sistema é entravado e burocrático em demasia, ou seja, é absurdamente positivado acaba por retardar ou obliterar esses Princípios que necessitam de aplicação direta, muita burocracia acaba por atrasar sua aplicação. Vide o que acontece com a política criminal de países positivistas em desenvolvimento, especialmente o Brasil. 

Voltando à Hobbes, essa acefalia do leviatã, o “o homem é o lobo do homem”, trás desse filósofo jusnaturalista a certeza que o homem precisa ser domado de forma direta, o que vai contra o contratualismo cartesiano de René Descartes e o positivismo herdado de nossos republicanos. Para ele, Hobbes, o homem no estado natural tem o desejo de usufruir todos os bens, ou seja, é egoísta, sufocando o direito do seu próximo.

E o que vemos na capital do Espírito Santo senão um verdadeiro sufoco perpetrado não só por marginais à sociedade quanto pela própria sociedade, culto ao homem natural com rédeas rompidas de um positivismo fraco estatal, sem a aplicação do Direito Natural com seus princípios necessários para guiar o cidadão ? Quase um eufemismo a liberar os instintos pela certeza de uma impunidade reinante no país das bananas. 

Não há como o capixaba, que vive a margem da lei, aceitar qualquer tipo de contrato social, muito pelo contrário, faz prova que a teoria do “bom selvagem” de Rousseau cai por terra. 

Cabe a nós um pergunta: Seria o positivismo abarcado pelas nossas universidades inapropriado ao nosso direito ? Ou seria melhor a aplicação de uma justiça mais eficaz? Estariam os países consuetudinários em vantagem na operacionalização do direito porque não precisam passar pela interpretação detalhada e extensiva de normas que muitas vezes “engessam” a efetivação da justiça? Acreditamos que a esta altura do campeonato não!, Mas não seria esse o problema fundamental, o problema fundamental nesse aspecto é que o positivismo parece servir mais para a manutenção do poder de classes, basta ver que a tributação e orçamento, a ordem econômica e financeira e a ordem social, também estão positivadas na CF ao lado dos Direitos Fundamentais.

Não obstante, em uma leitura da obra do mestre Hobbes podemos concluir que sua teoria pode até ser utilizada pelos positivistas em razão da necessidade da obediência à norma positiva, pois mesmo com extensa escrita prevalecerá sempre o valor maior da norma natural, fundamental e necessária a uma obediência que venha do próprio homem delimitada pela norma. O que é necessário é uma maior ênfase na aplicação dos Direitos Naturais através da efetivação de normas infraconstitucionais como a Lei de Execuções Penais, que urge por uma reforma, basta ver os números da reincidência entre presos em nome de uma falsa ressocialização. 

Enquanto não houver uma mudança radical nas amarras positivistas, haverá situações anômalas em um país vive com Suíças dentro de Haitis. 

BIBLIOGRAFIA

HOBBES, Thomas. O Leviatã. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1972;

NADER, Paulo. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO. São Paulo: Editora Forense, 2009;e

BOBBIO, Norberto. Thomas Hobbes. Editora Campus, tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro, 1991.


POR CHRISTIAN BEZERRA COSTA











-Advogado graduado pelo UNIEURO Brasília;
-Atuante nas áreas de Direito Internacional Privado e Civil;
 -Twitter: @advchristiancos

Nota do Editor:

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2 comentários:

  1. Síntese:
    O predador da raça humana, é o próprio ser humano...

    Hobbes, vivo, hoje ficaria horrorizado com a natureza nefasta e natural dos nossos políticos, e fascinado com uma alma ambulante que tinha o contrato social de evitar a guerra em todo o país, mas nos deixou expostos à barbárie e ao medo...

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  2. Perfeito, mas estendo essa toalha aos três poderes, especialmente ao uso político do STF. Saímos da panela e caímos em uma frigideira que quer manter o mesmo sistema funcionando. Vide políticos do naipe de Renan e Sarney.

    Christian Bezerra Costa

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