segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Meu pai, meu herói


 Autor: Edson Domingues(*)

Euclides era o seu nome de batismo. Filho mais velho de uma família com nove irmãos. Foi à escola, mas frequentou apenas o primeiro ano primário.

Desde cedo ajudava a sua família. Era um caboclo não muito alto, de pele escura, provavelmente herdada de seus antepassados indígenas.

Casou-se com a minha mãe, Alfazina, e vieram morar em São Paulo, onde tiveram 5 filhos, duas mulheres e três homens, eu era o quarto da prole.

Mal sabia fazer contas, e assinar o nome, mas nenhum filho ficou sem estudar. Não sei por que, mas os homens cursaram a universidade, o que não ocorreu com as meninas. Levávamos uma vida simples, com muito sacrifício, e muitas vezes com carências materiais, mas a primeira lição que tive com ele, foi a de não esmorecer jamais. Não era um otimista, mas esperançoso.

Outra lição aprendida foi a de humildade. Os irmãos dele tinham por hábito, reunir e jogar buraco na casa de um deles, periodicamente, e ele, dada a sua dificuldade intelectual era muitas vezes deixado de lado nessas reuniões familiares. Mas ele não perdia nenhuma, querendo sempre estar ao lado de seus irmãos, não interessando como.

A sua persistência e tenacidade nos foi mostrada no tempo em que ele trabalhava. Era alfaiate, e dos bons, e vi, não poucas vezes, ele varar a noite costurando para entregar o serviço encomendado, que nem sempre era pago na hora, embora ele precisasse, e nunca perdeu a calma com os caloteiros, e no outro dia, lá estava ele a trabalhar com afinco.

Não era uma pessoa que irradiava alegria, mas era tranquilo, e não passava para nós os dramas financeiros que vivia, essa era uma tarefa árdua, por sinal, da minha mãe.

Não era modelo de homem bem-sucedido, mas nos ensinou, ainda que sem expressar, a cada um procurar o seu destino, e isso podemos constatar, pois cada um dos seus filhos tem uma vida que escolheu, e as vive da melhor forma possível, cada um do seu jeito, e de acordo com o que conquistou.

Tenho absoluta certeza de que foi um enviado dos nossos anjos da guarda, pois ele viveu a sua vida tentando organizar uma família, e em 1971, no mês de agosto, foi embora, em silêncio, sem se despedir, ou ficar doente, tenho a sensação de que foi satisfeito por ter cumprido a sua missão, o seu papel nesta existência terrena. Foi em paz, sem alarde ou sofrimento, como fora toda a sua vida, pois cada um de nós já poderia então, tocar a vida.

Ainda hoje, cinquenta anos depois, busco dentro de mim mais lições que tenha aprendido com ele, meu herói, vencedor da maior batalha de uma vida, ter uma família!

* EDSON ALVES DOMINGUES













-Psicólogo formado pela Universidade de Guarulhos – 1977;
-Especializado em Psicodrama, com titulação em Terapeuta, Terapeuta de Alunos, Professor e Supervisor pela Federação Brasileira de Psicodrama; 
-Especializado em Terapia de Casais e Família pelo Instituto Bauruense de Psicodrama e
-Psicólogo Clínico, por 20 anos. 

Nota do Editor:

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