sábado, 15 de outubro de 2016

Ser professor não é ser ti@



Sou professor e não tio; sou um profissional assim como o advogado, por exemplo; aliás, este nunca foi chamado de tio pelos seus clientes, mas como Doutor. Mesmo que tenha apenas o Bacharelado. Uma das minhas titulações é a de Especialista: por que não ser chamado de especialista? Sempre quando perguntam minha profissão, tenho a honra de me apresentar como “professor”. Ser professor não é ser ti@. Entendo que por detrás da expressão há uma ideologia, isto é, existe uma realidade concreta, que precisa ser analisada pela gênese do processo e que devemos sempre parar para identificar as distorções dos nossos conceitos, posições e como foram produzidas historicamente. 

Segundo Rainer Sousa, “nos primeiros anos de vida escolar, as crianças criam um forte vínculo com a professora que as orientam durante as aulas e atividades desenvolvidas em classe. Segundo especialistas, alguns alunos promovem um tipo de extensão materna na figura da professora que muitas vezes ganha o informal título de tia. Alguns veem nisso uma demonstração de proximidade, outros salientam nesse costume um sério desvirtuamento da função formadora que o profissional da educação possui”.

Em Professora sim, tia não cartas a quem ousa ensinar (1997), Paulo Freire deixa claro que “recusar a identificação da figura da tia não significa, de modo algum, diminuir ou menosprezar a figura da tia, da mesma forma como aceitar a identificação não traduz nenhuma valoração à lei. Significa, pelo contrário, retirar algo fundamental ao professor: sua responsabilidade profissional de que faz parte a exigência política por sua formação permanente. (...) A razão se deve a dois pontos principais: evitar uma compreensão distorcida da tarefa profissional do professor e desocultar a sombra ideológica repousada manhosamente na intimidade da falsa identificação. (...) Professoras, boas tias, não devem brigar, não devem rebelar-se, não devem fazer greve...”.

Obviamente a relação professor e aluno é importantíssima. Em um ambiente saudável o aprendizado pode ser construído. Uma relação de confiança possibilita uma motivação maior para todas as partes envolvidas no processo. O professor é aquele que sabe administrar os conflitos e promover resoluções de situações – problemas contextualizados, que necessitam de abordagens interdisciplinares, portanto - para que todos tenham voz e vez no exercício do respeito mútuo. Sendo assim, o diálogo será à base dessa relação.

Família e escola devem trabalhar em parceira. Sozinhas não conseguem a responsabilidade de educar e ensinar. A família é a base de educação e formação e, consequentemente, contribui para que o filho apresente resultados acentuados a cada bimestre. Os problemas não estão separados e podem está nesse relacionamento. Ambas buscam identificar as causas dos conflitos e das dificuldades e buscam possíveis caminhos de ações a serem trilhados no ensino e no aprendizado, que permitem o entrosamento entre si, definindo papéis e missão para o sucesso educacional do aluno.

A escola foi criada para servir a sociedade. Mas o professor não é ti@ para ensinar bons modos, por exemplo, mas para atuar no ensino dos conteúdos e promover, em sua prática pedagógica, o desenvolvimento do compromisso com os valores estéticos, políticos e éticos da sociedade moderna.

Para a escola, os alunos são apenas transeuntes psicopedagógicos. Passam por um período pedagógico e, com certeza, um dia vão embora. Mas, família não se escolhe e não há como mudar de sangue. As escolas mudam, mas os pais são eternos (Içami Tiba, 2002, p. 18).

Ser professor não é ser ti@; ser professor é superar a visão de mediador entre o aluno e o conhecimento para ser, também, orientador e tutor, possibilitando, assim, que o mesmo busque a informação adequada dos meios de comunicação e tecnologias.

Ser professor não é ser ti@, ou aquele que não conseguiu casar ou que frustrou na vida e, como não tinha outra “habilidade”, resolveu “ser professor”. A formação de um professor é permeada tanto pela teoria quanto pela pratica pedagógicas, de modo a promover o conhecimento experiencial do profissional em formação. Há competências profissionais que precisam ser comuns a todos os professores – tais competências são construídas como eixo da formação da identidade profissional e da dimensão pedagógica do trabalho. Ser professor, portanto, é ser um profissional habilitado, especialista, mestre ou doutor em uma área do conhecimento específico. É aquele que entende o aluno não como seu “sobrinho”, seu “parente” ou “filho do amigo” ou muito menos como um ser “sem luz[1]”, mas o sujeito do processo ensino-aprendizagem: indivíduo e cidadão que passam a ter um olhar crítico sobre a realidade que o cerca. Ser professor é exercer a sua função que é de “afirmar valores e atitudes para pessoas com rostos, experiências, culturas e saberes” (FRIGOTTO, G. 2009, p. 29).

REFERÊNCIAS


[1] Aluno. De origem latina, indica: a, sem ou ausência de e lummi “luz”, ou seja, sem luz.

POR FERNANDO MARTINS










-Formado em Ciências Sociais e Teologia;
-Pós graduação em Metodologia do Ensino de História;
-Escritor, Palestrante e Professor de História na Rede Pública Estadual
Twitter: @filosonando

4 comentários:

  1. Respostas
    1. Prezada Samira, interessante que o artigo vem justamente no dia do professor. Recebi muitos comentário positivos e alguns dizendo que vão trabalhar com este artigo em reuniões para debates etc. Nós, professores, somos os profissionais ESSENCIAIS, IMPRESCINDÍVEIS E INSUBSTITUÍVEIS no processo de mudança social. Abraço.

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  2. Parabéns!" Ser professor não é ser tia." Uma grande verdade.
    Profissional insubstituível e essencial...

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